As ações já subiram muito desde o pior momento da Bolsa brasileira. Enquanto
isso, na economia real, houve aumento de 30% dos pedidos de falência de
empresas, com 600 mil empresas fechando as portas e mais de 9 milhões de
funcionários demitidos. Será que está se formando uma bolha na Bolsa e ela
vai estourar em algum momento?
Eu sou César Esperandio, economista do Econoweek, a tradução da economia
e, agora, vou contar o que realmente está acontecendo e onde investir para
aproveitar essa recuperação sem se expor tanto ao risco de tudo voltar cair
outra vez caso essa bolha estoure.
Por que as Bolsas vão bem?
Desde o pior momento dessa crise, as principais Bolsas de Valores do mundo
já recuperaram quase tudo o que perderam, animadas com a reabertura do
comércio nas principais economias e com a esperança de que o problema do
coronavírus comece a ser superado.
Então quer dizer que todo mundo que perdeu o emprego já arrumou outro? Ou
que todas as pequenas e médias empresas, que não venderam quase nada
durante a quarentena e tiveram que demitir os funcionários porque não
conseguiram acesso ao crédito, já recuperaram o tempo perdido, fizeram
todas as vendas não feitas durante o tempo fechado e voltaram a contratar os
ex-funcionários?
Não é bem por aí!
Enquanto vemos toda essa euforia do mercado financeiro, com a Bolsa
subindo com rapidez, apesar de altas e baixas normais no meio do caminho, a
economia real ainda está sofrendo os efeitos dessa crise. E, por isso, tenho
uma pergunta: será que está se formando uma bolha no mercado financeiro?
Em 2019, eu já havia explicado como se preparar para a crise de 2020. Pouca
gente deu ouvidos, mas ela veio.
Pelo bem ou pelo mal, eu já tenho uma estratégia de investimentos traçada
caso o pior volte a acontecer.
Não vou ficar de fora das ações e nem da renda fixa, mas tenho uma estratégia
defensiva que inclui ativos de renda fixa que rendem mais de 10% ao ano,
como alguns CDBs de menor liquidez, CCBs com garantias, e outros exemplos
que mostrarei após a discussão se há uma bolha prestes a estourar ou não.
Por que as Bolsas estão subindo tanto?
Os motivos para o otimismo basicamente são:
1. Em primeiro lugar, quando começaram as primeiras notícias do coronavírus
e as primeiras empresas começaram a fechar, com cidades entrando em
quarentena, tudo era muito novo e ninguém sabia direito o que vinha pela
frente.
Com a sensação de medo e aversão ao risco, as Bolsas começaram a
despencar, com circuit breaker atrás de circuit breaker, e os investidores ao
redor do mundo buscaram investimentos mais seguros.
Como o Brasil é considerado uma economia emergente e, portanto, mais
arriscada, os dólares dos investidores foram embora daqui em busca de
investimentos menos arriscados, como títulos do Governo americano,
equivalente ao nosso Tesouro Direto. Mesmo os investidores brasileiros
buscaram mais segurança dentro do Brasil e tiraram seu dinheiro da Bolsa,
buscando refúgio na renda fixa.
É exatamente isso que fez a Bolsa cair e o dólar disparar recentemente.
Agora, o sentimento de aversão ao risco está diminuindo no mundo, de modo
que investidores estrangeiros que fugiram do Brasil em busca que ativos mais
seguros, começam a retornar de olho em maiores retornos, ao mesmo tempo
que os brasileiros também estão voltando a investir mais na Bolsa.
2. Mas você se lembra que os governos e bancos centrais ao redor do mundo
botaram um monte de dinheiro na economia para evitar que a crise fosse mais
profunda?
Aqui no Brasil, houve cortes na Selic: a taxa básica de juros caiu para o menor
nível da história. E teve também o pagamento de auxílio emergencial para
trabalhadores informais, além de crédito subsidiado para os micros e
pequenos empresários, redução de compulsórios, entre outras medidas.
Mas nem toda essa liquidez, como é chamado o excesso de dinheiro injetado
na economia, encontrou seu destino final, que ficou parado no sistema
financeiro. Agora com a volta do otimismo e a queda da aversão ao risco, essa
nova tendência de buscar investimentos mais arriscados e mais rentáveis é
intensificada pela alta liquidez global recente.
Esse é um dos principais fatores que faz a Bolsa subir com força.
Está tudo mil maravilhas?
Em primeiro lugar, não podemos perder de vista que o coronavírus ainda não
foi erradicado do mundo, ainda não há uma vacina e, por mais que alguns
países conseguiram controlar a transmissão, em outros lugares, a situação
ainda é de total descontrole.
Você conhece algum país assim?
Quando falamos de um vírus altamente contagioso, não adianta a situação
estar controlada em um lugar, se seu vizinho ainda está doente. A chance de
uma nova onda de infecção não pode ser ignorada, mesmo que possa parecer
que não é um grande risco no momento.
Em segundo lugar, e talvez o mais importante, o excesso de liquidez global
pode estar deixando os investidores bêbados de otimismo diante da
oportunidade de recuperarem todo o dinheiro perdido nessa crise.
Bolsa pode guiar recuperação da economia real?
O novo fator que anima investidores para uma forte recuperação da economia
é a expectativa de haver várias rodadas de IPOs (quando empresas abrem
capital na Bolsa, lançando ações de uma companhia até então não disponíveis
para os investidores) justamente para aproveitar essa imensa liquidez,
abundância de dinheiro e investidores buscando rendimentos mais atraentes.
Esse movimento, se ocorrer, ainda vai encontrar a seu favor um cenário de
juros baixíssimos, que gera mais incentivo para o investidor não ser muito
conservador e migrar da renda fixa (como o Tesouro Direto ou CDBs) para as
ações da Bolsa.
Teoricamente, IPOs têm o potencial de fazer o fluxo de dinheiro migrar dos
investidores para empresas que ainda não podiam contar com esses recursos.
Por sua vez, elas poderiam reestruturar todas suas finanças e continuar
gerando emprego, fazendo a economia girar, o que não aconteceria sem
acesso a esse "financiamento" via emissão de ações.
Por outro lado, a empresa que emitiu novas ações na Bolsa, também poderia
provisionar todo esse dinheiro para enfrentar o período difícil que passamos,
sem, necessariamente, contribuir para o reaquecimento da economia real e
para a queda do desemprego. É um risco.
É uma bolha?
Mesmo no melhor cenário, será que essas poucas empresas que podem
lançar ações na Bolsa vão gerar todo esse efeito positivo para as inúmeras
empresas que não estão na Bolsa?
De acordo com o Sebrae, há mais de 19 milhões de empresas no Brasil.
Enquanto na B3 há ações de apenas 421 empresas na Bolsa.
Não estou tão confiante de que se mais algumas empresas lançarem ações na
Bolsa, o Brasil vai começar a melhorar e todos os problemas vão se resolver no
mesmo ritmo que a Bolsa está se recuperando.
Segundo o levantamento do Sebrae, mais de 600 mil empresas fecharam as
portas e pelo menos 9 milhões de funcionários foram demitidos.
1/3 dos empresários tiveram que buscar empréstimos para passar por esse
período, sendo que 30% ainda não teve resposta do banco e mais da metade
teve o pedido negado. Essa pesquisa é de abril de 2020. De lá para cá, a
dificuldade aumentou.
Os pedidos de falência aumentaram 30% só em maio, enquanto os pedidos de
recuperações judiciais das empresas subiram 68%, de acordo com a
BoaVista.
O Governo até anunciou R$ 40 bilhões em crédito subsidiado para ajudar os
pequenos e médios empresários. Mas é tanta burocracia e falta de garantias
do governo, que desse R$ 40 bilhões, apenas R$ 4 bilhões foram emprestados,
segundo a Febraban.
E as empresas continuam quebrando, principalmente as pequenas e médias,
que são as que mais geram empregos no Brasil.
Apesar do bom humor nas Bolsas, não podemos esquecer que, na economia
real, empresas passam por dificuldades, pessoas perderam seus empregos e
o PIB do Brasil deve encolher nesse ano. A recuperação da Bolsa pode
alimentar a recuperação da economia real, mas se isso não acontecer e o
descompasso ficar muito grande, ficará evidente que toda essa euforia foi só
uma bolha e as Bolsas serão corrigidas mais para frente, com nova rodada de
quedas.
Então, fica de olho nisso!