Cristais do tempo permitirão simular internet inteira
TECNOLOGIA
Publicado em 25/11/2020

Cristais do tempo

Os cristais do tempo ainda parecem coisa de ficção científica - só que não são, e podem se tornar a principal tecnologia das redes que funcionam obedecendo as leis da mecânica quântica.

Teorizados pela primeira vez em 2012, pelo físico Frank Wilczek, e observados experimentalmente em 2016, os cristais do tempo são arranjos de matéria que se repetem no tempo. Cristais normais, como um diamante ou um grânulo de sal, repetem sua auto-organização atômica no espaço. Os cristais do tempo se auto-organizam e repetem seus padrões no tempo, o que significa que sua estrutura muda periodicamente com o passar do tempo - é por isso que os físicos dizem que os cristais do tempo poderão sobreviver ao fim do Universo.

Pesquisadores desenvolveram agora um método para usar cristais do tempo para simular gigantescas redes usando um poder de computação muito pequeno, permitindo estudar essas redes e prever o funcionamento de novas redes antes de sua implantação.

Marta Estarellas e sua equipe do Instituto Nacional de Informática, no Japão, queriam saber se a natureza quântica dos cristais do tempo - como eles mudam de momento a momento em um padrão previsível e repetitivo - permitiria usá-los como simuladores para estudar grandes redes especializadas, como as redes de comunicação ou de inteligência artificial.

"No mundo clássico, isso seria impossível, já que exigiria uma quantidade de recursos de computação descomunal," disse Estarellas. "Não estamos apenas trazendo um novo método para representar e compreender os processos quânticos, mas também uma maneira diferente de ver os computadores quânticos."

Redes sem escala

O trabalho da equipe consistiu em representar o "derretimento" de um cristal do tempo em termos de redes, e isso revelou o surgimento de um tipo muito especial de estrutura: as redes sem escala. Essas redes complexas têm as mesmas propriedades estruturais da internet ou das redes do tráfego aéreo, por exemplo. Assim, ter um sistema físico que permita sua simulação eficiente em laboratório tem enormes implicações na área de tecnologia.

Usando um modelo de cristal do tempo discreto, que pode ser realizado experimentalmente, a equipe descobriu que a estrutura pode ser derretida adicionando um erro ao sistema, o que, no caso de um experimento prático, pode ser feito com um aumento de temperatura. "Auxiliados por uma técnica de visualização de rede, pela primeira vez lançamos uma nova luz sobre os mecanismos pelos quais o cristal do tempo derrete," disse Estarellas.

"Além disso, ficou claro que, com um valor crescente de erro, o derretimento do cristal do tempo se comporta como uma transição de fase, algo semelhante à forma como cristais, como um bloco de gelo, normalmente derretem," acrescentou o professor Victor Bastidas.

Cristais do tempo permitirão simular internet inteira
Forçando os cristais do tempo a se fundirem é possível simular redes sem escala.
[Imagem: M. P. Estarellas et al. - 10.1126/sciadv.aay8892]

Simuladores quânticos

O próximo passo, naturalmente, será construir o dispositivo prático, e a equipe já tem planos para usá-lo para dar um nível novo de capacidade aos processadores quânticos, embutindo neles redes complexas exponencialmente grandes em alguns poucos qubits, ou bits quânticos, viabilizando a simulação de eventos muito complexos.

Os simuladores quânticos estão ganhando uso prático mesmo antes dos computadores quânticos porque eles permitem simular diretamente eventos impraticáveis de serem simulados nos supercomputadores usando descrições clássicas via software. Por exemplo, para descobrir novos materiais ou novos medicamentos é preciso simular reações químicas, e estas só podem ser simuladas por um dispositivo no qual os elementos fundamentais se comportem como no mundo real, ou seja, seguindo as leis da mecânica quântica.

"Usando este método com vários qubits, pode-se simular uma rede complexa do tamanho de toda a internet mundial," disse o professor Kae Nemoto.

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