Dispositivos armazenam informações médicas e podem monitorar sinais vitais e,
no futuro, até doenças como a Covid-19
O Globo
18/03/2020 - 14:03 / Atualizado em 18/03/2020 - 14:13
SÃO PAULO - Em tempos de preocupação com o coronavírus, ações comuns como abrir portas ou desbloquear smartphones viraram foco de preocupação constante na luta para diminuir o surto da nova doença. Mas, para Thiago Bordini, diretor de inteligência cibernética da NewSpace, isso já deixou de ser um problema: o pesquisador tem dois chips implantados, um em cada mão, que permitem que ele entre tanto na empresa como em casa apenas aproximando as mãos de um sensor. Os chamados "biochips", contudo, podem ir além, e são uma das apostas da medicina para a contenção de epidemias como a da Covid-19.
Os dois chips nas mãos de Bordini já tem capacidade para armazenar algumas informações, inclusive médicas. Contudo, pesquisas na área já indicam que os implantes no corpo poderão ser muito mais comuns no futuro. Em 2018, o departamento de vigilância sanitária dos Estados Unidos aprovou um equipamento de monitoramento de índices de glicose. A proposta é que o sensor possa ser implantado no corpo de pessoas que sofrem de diabetes e pode ser utilizado por até 90 dias. Com isso, ao contrário de medições regulares, seria possível ter informações sobre o índice de açúcar no sangue 24 horas por dia. Outras pesquisas apontam para a capacidade de monitoramento de outros sinais vitais.
A princípio, Bordini colocou os chips por um interesse profissional. O profissional costuma ser contratado para, entre outros serviços, buscar vulnerabilidades em sistemas, ajudando empresas a se protegerem de possíveis ataques. Em 2017, com esse objetivo, colocou o primeiro chip. O dispositivo, contudo, funcionava apenas como um identificador. Em 2018, o pesquisador implantou o segundo chip, dessa vez capaz de fazer leitura em smartphones mas também armazenar dados dentro dele - o chip, envolto em vidro, o que impede oxidação e inflamação, armazena 4 Kb.
— O interesse da pesquisa era entender qual vulnerabilidade existia nesse tipo de tecnologia, o que eu poderia usar, tanto do lado benéfico quanto do lado maléfico da tecnologia. Um dos testes que eu acabei fazendo foi armazenar dados, descobrir se eu conseguiria acessar o celular de outra pessoa aproximando minha mão , abrir uma página e podia por exemplo direcionar para algum outro site, coletar fotos, pedir instalação de um programa malicioso — explica Bordini.
O potencial do biochip chamou a atenção de Bordini, que procurou especialistas para trabalhar em pesquisa para a utilização dos biochips para objetivos de saúde.
— Nesse meio período acabei conversando com uma pesquisadora do que chamamos de biohacking, que também trabalha dentro de um hospital. A nossa ideia gora é pensar numa forma de armazenar os dados de prontuário médico, utilizar como pulseiras para quem é diabético. É possível armazenar essas informações para dentro do biochip — explica.
Bordini, no entanto, afirma que a utilização dos chips para diagnósticos de doenças como o coronavírus ainda está restrita ao futuro. Até o momento, os biochips não são autônomos: ou seja, precisam de algum tipo de estímulo, como a informação transmitida via frequência de rádio para que possa transmitir dados. Segundo o pesquisador, no entanto, é o cenário atual. Para o diretor da NewSpace, é questão de tempo para que pesquisadores avancem neste sentido.
Segundo uma pesquisa da Universidade do Texas, no futuro, os biochips podem ser usados em pacientes doentes com um dispositivo de monitoramento de diagnóstico. "Ao invés de visitas constantes a hospitais, com testes invasivos, as informações fisiológicas de pacientes poderiam ser coletadas continuamente, o que irá colaborar para os diagnósticos com mais precisão e menos inconveniência", diz a pesquisa.
A crise do coronavírus deixou clara a dificuldade dos sistemas de saúde ao redor do mundo em conseguir testar e lidar com um número enorme de pacientes em busca de um diagnóstico. A primeira vítima da doença morreu sem saber do seu diagnóstico e, como o GLOBO revelou, seus parentes ainda não foram testados. A última recomendação da Organização Mundial da Saúde apontou que os países que melhor lidaram com a doença foram aqueles que implantaram testes em larga escala. No Brasil, por enquanto, as autoridades defendem que apenas os casos mais graves sejam testados.
Para Bordini, a implantação de biochips no futuro pode até não solucionar esses problemas, mas tem o potencial para facilitar, e muito, a vida de médicos e do sistema de saúde.
— Quando falamos de informações médicas, até pela capacidade do chip, não é armazenar toda sua vida médica, mas um resumo dos itens mais essenciais da sua vida: contatos de emergência, alergias, tipo sanguíneo, uso de medicamentos controlados. Se você perguntar para boa parte da população, ela não sabe qual é o tipo sanguíneo. Se alguém sofre um acidente e desmaia, você não sabe nada. São todas informações úteis — afirma.