Em apenas dois dias, o governador do Rio, Cláudio Castro (PSC), sancionou um projeto de lei, depois vetou e, finalmente, desistiu do veto. Todos os movimentos foram registrados no Diário Oficial. Com isso, o projeto batizado de "Escola Sem Mordaça", enfim, virou lei. A proposta garante a liberdade de expressão dentro das escolas públicas do estado.
"Todos os professores, estudantes e funcionários das escolas sediadas do estado são livres para expressarem pensamentos e opiniões no ambiente escolar, sendo assegurado o mesmo tempo espaço e respeito para quem deles divergir, bem como a pluralidade de ideias", diz o texto.
As mudanças de rumo do governador sobre a sanção ou não da lei, foram apontadas por especialistas como falta de conhecimento da legislação.
A lei diz que, depois de passar por um trâmite completo de votação na Assembleia Legislativa, a nova determinação pode ser vetada ou sancionada pelo governador. Contudo, depois de tomada a decisão, o chefe do executivo não pode voltar atrás.
Para o professor de direito constitucional da FGV, Wallace Corbo, o veto de quinta-feira (20) e a sanção desta sexta, foram atos sem efeito.
"Uma vez que ele sanciona o projeto, aquele projeto é promulgado, ele é publicado no Diário Oficial e se torna uma lei. Uma lei válida, uma lei em vigor. Que para ser revogada depende da Alerj novamente. O governador não pode vetar uma lei que já foi aprovada, ele não pode revogar uma lei", disse Wallace Corbo.
O projeto de lei aprovado pela Assembleia Legislativa (Alerj) é uma resposta ao movimento Escola Sem Partido, que se posiciona contra discussões que tenham como temas política e sexualidade no ambiente escolar. O Escola Sem Partido também incentivava alunos a filmarem professores em sala de aula, o que foi proibido no "Escola Sem Mordaça".
Na opinião do deputado Carlos Minc (PSB), um dos autores da lei, houve pressão política para que o governador tentasse vetar a lei já aprovada.
"A pressão foi da bancada bolsonarista e do próprio presidente. Como foi muito forte, ele acabou voltando atrás num gesto politico. Só que esse gesto politico não tinha amparo jurídico. Era algo completamente ilegal que ia cair em um dia na Justiça. Então ele foi convencido a voltar atrás. Felizmente prevaleceu o consenso e que a liberdade paire nas escolas", disse Minc.
- professores, estudantes e funcionários são livres para expressar opiniões
- veda cerceamento de opiniões por violência ou ameaça
- proíbe coação quanto à liberdade de ensinar
- veda uso de bens públicos para a propaganda eleitoral
- só permite filmagem de professores e estudantes com autorização (exceto videoaula)
- garante liberdade aos grêmios estudantis na promoção de debates
Para Priscila Dias, presidente da ONG Todos Pela Educação, a escola deve ser um lugar de liberdade de Ideias e de debates.
“Se uma criança, se um estudante, não tem acesso a opiniões diferentes e visões de mundo diferentes, ele vai crescer uma pessoa intolerante, que vai olhar para aquele que pensa diferente como inimigo. E não é isso que a gente precisa ter nas nossas escolas e muito menos é isso que a gente tem que promover na nossa sociedade brasileira”, comentou Dias.
Depois da sanção por parte do governador, na quarta (19), a deputada Alana Passos (PSL) pressionou Castro para que o Poder Executivo derrubasse a proposta. Na quinta-feira (20), ela chegou a comemorar o veto do governador como "uma sensação de dever cumprido".
No veto, Castro dizia que a implementação de medidas no ambiente escolar deve ser objeto de iniciativa do chefe do Poder Executivo. E que, segundo ele, a medida contrariava o princípio da separação dos poderes, "não restando outra opção a não ser de vetar a lei".
Mas, nesta sexta-feira (21), um despacho do próprio governador tornou o veto sem efeito. O projeto é dos deputados estaduais André Ceciliano (PT) e Carlos Minc (PSB), que prometiam ir à Justiça por considerarem inconstitucional o veto após sanção.
Depois da volta atrás de Castro, Alana declarou, nesta sexta, que "repudiou a nova atitude do governador". Para a deputada, "o projeto tem pontos questionáveis" e, agora, a deputada prometeu acionar a Justiça contra a lei.
O que diz o Governo do RJ
O RJ1 entrou em contato com o Governo do Estado para saber o motivo da voltar atrás um dia depois da aprovação do projeto de lei, mas até a publicação desta reportagem não obteve resposta.